Denúncias de preconceito e agressões contra trabalhadores que se recusam a entregar os produtos nas portas das residências dos clientes têm crescido no país. Mas o que fazer para evitar novas ocorrências?
No ano de 2024, a empresa Ifood recebeu mais de 19 mil denúncias de violência na plataforma de entregas, o que corresponde a mais de 50 ocorrências por dia, com 40% dos registros relacionados à discriminação e 26% de agressão física. Outro dado importante mostra que 16% dos casos atendidos estão relacionados à violência praticada contra entregadores por exigências de clientes para que subam ou se dirijam às portas das unidades privativas em condomínios.
Ganhou repercussão nacional um caso recente ocorrido em abril nas dependências de um condomínio na Região Metropolitana de Belém, onde um entregador de alimentos por aplicativo e uma moradora, delegada da Polícia Civil, protagonizaram um desentendimento, inclusive com ameaças e ofensas proferidas pela moradora que causaram revolta da classe trabalhadora e de quem assistiu ao episódio.
E tudo isso motivado pelo fato do trabalhador ter se negado a se dirigir à unidade privativa da moradora para realizar a entrega. Nesse universo de comodidade e facilidade proporcionado por aplicativos, de fato existe a obrigação do entregador se dirigir à unidade privativa para realizar a entrega ou ela deve ser retirada na portaria?
“O evento ocorrido na região metropolitana de Belém teve uma característica peculiar por envolver uma autoridade policial que, no calor da discussão, ameaçou dar voz de prisão ao trabalhador que se negou a subir ao apartamento”, destaca o advogado Pedro Henrique Tavares, especialista na área condominial.
Essa realidade lamentável, diz Pedro, tem se estabelecido em face da lacuna de leis, seja na esfera municipal, estadual ou federal, que tratem efetivamente sobre o tema, especificamente para normatizar e impor regras para essa atividade no Brasil, bem como para proteger os milhares de trabalhadores que têm sido submetidos aos mais variados tipo de violência em condomínios, “Em março do ano passado um morador do Rio de Janeiro chegou a atirar contra um entregador após uma discussão sobre sua negativa em subir para entrega no apartamento”, cita.
LEIS
Em algumas capitais como Fortaleza, Manaus e na Paraíba, já existem leis que impõe regras para que as entregas sejam feitas na portaria, seguindo as recomendações das empresas de aplicativos que também condicionam as entregas nestes locais, vedando que os trabalhadores sejam obrigados por clientes a subirem.
“No Congresso Nacional tramitam dois Projetos de Lei (PL 1.286/2024 e PL 583/24), que visam a regulamentação das entregas de produtos e mercadorias em condomínios residenciais, de modo a assegurar que os trabalhadores não sejam obrigados a subir até à porta das unidades habitacionais ou comerciais, salvo quando se tratar de consumidor pessoa idosa, com deficiência ou mobilidade reduzida”, afirma o advogado.
“Condomínios, condôminos e síndicos devem fomentar campanhas de conscientização e regras internas para dirimir conflitos e organizar esse fluxo internamente, de modo que essa relação entre cliente e trabalhador seja de respeito mútuo e bom senso”, destaca Pedro.