Ela afirma que outras pessoas do seu prédio também foram fotografadas pelos vizinhos, mas que foi a única que decidiu tomar providências em relação ao ocorrido
Durante a quarentena, a professora Paula, cujo nome foi trocado para preservar sua identidade, tomava sol em casa no bairro de Perdizes, em São Paulo. O que ela não sabia é que cenas dela com trajes íntimos e nua, dentro do seu próprio apartamento, estavam sendo registradas por vizinhos que vivem em um prédio ao lado.
A professora tomou conhecimento das imagens quando o zelador dos vizinhos procurou funcionários do seu prédio. Ele alegou estar ali em nome dos moradores e cobrou que medidas disciplinares fossem aplicadas à mulher que andava nua dentro de casa.
“Estamos num período de isolamento, eu tomo sol e ando na minha casa da forma que eu quiser”, afirma a professora que diz ter se sentido completamente constrangida ao descobrir das suas fotos de diferentes momentos e ocasiões, que circularam em grupos de WhatsApp. “Me senti mal, exposta, envergonhada. Não estou fazendo nada de errado, nada que tenha a ver com ninguém”.
Ela afirma que outras pessoas do seu prédio também foram fotografadas pelos vizinhos, mas que foi a única que decidiu tomar providências em relação ao ocorrido. Paula contratou a advogada criminalista Maira Pinheiro para cuidar do caso. Um inquérito foi aberto no 23º Distrito Policial, em São Paulo.
Além disso, ela confeccionou um imenso cartaz vertical que foi exposto na sua janela. Na faixa, ela alerta os vizinhos os artigos do Código Penal que eles violaram, como o 216-B, que prevê pena de detenção de seis meses a um ano de multa a quem “produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes”.
Maira Pinheiro diz que Paula não estava expondo a sua nudez em espaço público. “Ela foi fotografada por pessoas que, para verem o que estava acontecendo, precisavam estar ali bisbilhotando”, diz.
A advogada explica, ainda, que a partir do momento em que há uma fotografia de uma pessoa em situação de nudez sem o seu conhecimento “há uma extrapolação, em absoluto, de qualquer discussão sobre o direito de segurança”. “Depois do momento criminoso em que ocorre a fotografia, há outro crime que é quando a fotografia é divulgada”, explica ela.
Pinheiro diz que desde que o início da quarentena supôs que casos como esse pudessem acontecer e que tem percebido todas as modalidades de violência de gênero, desde violência doméstica a pornografia de revanche.
Isabela Guimarães, advogada da Rede Feminista de Juristas, indica alguns caminhos para pessoas vítimas de uma invasão como a da professora. Quando se sabe a autoria do registro, a primeira coisa é fazer um boletim de ocorrência. Dali, pode ser aberto um inquérito contra o agressor ou uma ação na esfera civil solicitando indenização.
Quando não se sabe a autoria do crime, há outros dois caminhos: levar o caso para autoridades policiais para que seja realizada uma averiguação do agressor ou contratar um advogado particular para entrar com uma ação de verificação da autoria.
Se a imagem, por exemplo, é divulgada em alguma rede social, a empresa é contatada para que se descubra o IP (Internet Protocol, em inglês), número que identifica cada computador conectado à internet, de quem espalhou esse tipo de conteúdo.
Ela também explica que a única exceção para que uma empresa remova algum conteúdo sem a necessidade de ordem judicial é quando há divulgação de imagens íntimas sem consentimento das pessoas envolvidas.