Condomínio de luxo pode ser levado pela lama em quatro minutos

Documentos mostram riscos em caso de rompimento em Nova Lima e Itabirito

Uma das áreas mais nobres da região metropolitana de Belo Horizonte ficará debaixo de lama em quatro minutos, caso haja rompimento da barragem Capão da Serra, em Nova Lima. A estimativa foi feita pela responsável pela barragem, a Vale, em seu plano de ação emergencial de barragem, ao qual a reportagem de O TEMPO teve acesso.

O plano prevê que, além de atingir o condomínio Pasárgada – um dos mais luxuosos de Nova Lima – rapidamente, em caso de uma ruptura, a lama ainda poderia destruir o distrito de São Sebastião das Águas Claras, conhecido como Macacos, em apenas 12 minutos. Nesse local existem 304 casas residenciais, além de várias pousadas e restaurantes. Os moradores, porém, receberam a informação de que a lama atingiria 17 casas e a portaria do condomínio. Ao menos dez imóveis ficariam ilhados.

Além disso, o documento simula que, em três horas e 47 minutos, a lama já chegaria ao rio das Velhas, passando antes por Vila Castelo, Jardim Petrópolis e pelo Centro de Treinamento Nova Lima Rugby. A barragem tem atualmente 2,23 milhões de metros cúbicos de rejeitos e continua ativa.

De acordo com o presidente da Associação dos Proprietários de Pasárgada (Aspas) e diretor da Associação dos Moradores de Macacos, Manoel Ambrósio de Oliveira, os moradores tentam há mais de dez anos a abertura de uma rota de fuga em caso de um possível rompimento da barragem Capão da Serra. Residente há nove anos do condomínio Pasárgada, Oliveira relata que foi somente após do tragédia de Mariana, em 2015, que a Vale instalou sirenes no local. No entanto, um plano de fuga e treinamento com os moradores ainda não foi feito.

“As pessoas podem ficar com medo. Nossa esperança é que desativem as operações das barragens, como tem sido divulgado”, alerta. Ainda segundo o diretor da Associação dos Moradores de Macacos, se um desastre acontecer, o município, que vive principalmente do turismo, terá perdas incalculáveis.

Outros planos. A reportagem verificou ainda os planos de emergência de outras duas barragens ativas, segundo a Prefeitura de Nova Lima: Maravilhas II, em Itabirito, que também pertence à Vale, e Cachoeirinha, em Nova Lima, da Vallourec. Esta última, em caso de rompimento, atingiria imediatamente um dos trechos mais movimentados da BR–040, perto do acesso a Ouro Preto.

Legislação

O plano de ação emergencial é obrigatório por lei. Nele, as mineradoras elaboram situações hipotéticas sobre problemas na barragem. A classificação de “emergência” é feita em três níveis. No primeiro, quando “alguma anomalia” é detectada, as empresas abrem procedimento interno e avisam a Defesa Civil Nacional. O segundo nível é acionado quando a “anomalia” não está controlada. Prefeitura e Defesa Civil Municipal são acionadas. O nível três é quando a barragem vai ou já rompeu.

Para especialista, é ‘inviável’ escapar

A estimativa de 4 minutos para moradores deixarem suas casas no condomínio Pasárgada, em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, caso a barragem Capão da Serra se rompa, é inviável, segundo o professor de geologia da Universidade Federal de Viçosa, Eduardo Antônio Gomes Marques.

“Esse é um dos problemas. Não dá (para sair em quatro minutos). É inviável. Se for do lado de casa, tudo bem. Só dá certo se tiver perto do ponto de encontro”, disse.

Para o professor, mesmo que os moradores passem por treinamento, uma situação real de risco envolve outros elementos: “Tem treinamento, mas aí tocam a sirene e você tem que correr. Na hora, tem nervosismo, confusão, vai e volta”, alerta.

A reportagem entrou em contato com a Vale no último sábado para falar sobre as barragens Capão da Serra e Maravilhas II, mas, até o fechamento desta edição, a empresa não havia respondido.

A Vallourec disse que não dispõe mais de barragem de rejeitos, ao contrário do que informou a Prefeitura de Nova Lima sobre a barragem Cachoeirinha. Diz a empresa, via assessoria de imprensa: "Desde 2015, a então barragem Cachoeirinha, que atualmente encontra-se seca, foi substituída por um sistema de disposição de rejeitos pelo empilhamento drenado. Por meio desse sistema, os rejeitos gerados no processo são filtrados e prensados e os blocos (ou “bolachões”) dispostos em pilhas que são posteriormente revegetadas."

Na reta, nove cidades e sete rodovias

Em Itabirito, se a barragem Maravilhas II, da Vale, se romper, a lama atingirá condomínios e bairros de nove cidades em até 72 horas. São eles Nova Lima, Rio Acima, Raposos, Sabará, Santa Luzia, Lagoa Santa, Baldim, Jequitibá e Santana de Pirapama. Seu plano de emergência prevê que os rejeitos cheguem em até seis minutos aos condomínios Estância Alpina e Vale dos Pinhais, em Nova Lima.

Em três dias, rios, estradas e zonas urbanas seriam afetados. Sete rodovias sofreriam com os danos: BR–356, MG–150, AMG900–140, MG–437, MG–262, MG–145 e MG–020.

No condomínio Vale dos Pinhais, a síndica Maria do Carmo Ferreira, 58, desconhece algum plano emergencial para o local. Para a moradora, todas as pessoas que moram próximo a barragens estão psicologicamente abaladas. O jornalista Donaldo Dinarti, 70, está há mais de 40 anos no Condomínio Estância Alpina, onde só tem sirene. “Todos querem que outra empresa ateste a real situação dessa barragem, não dá para confiar só na Vale”.