Como lidar com as queixas?
O condomínio é a primeira sociedade que participamos depois da própria família. Da porta pra fora o vizinho é o nosso próximo. Não se escolhe quem mora na porta ao lado, acima ou abaixo de nós.
São um aglomerado de pessoas que por uma eventualidade, coincidência, ou acaso, acabaram indo morar no mesmo condomínio. Assim como na sociedade, há perfis que não estão necessariamente alinhados com a gente, mas mesmo assim, a boa convivência é o que nos permite evoluir como humanidade.
Lembro-me de uma vez que ao passar uma noite mal dormida por causa do ar-condicionado do apartamento de acima, que pingou a noite toda sobre o meu, eu mandei um e-mail bem mal educado para o síndico. Exigi que ele resolvesse o “meu” problema alertando a vizinha do andar de cima, que consertasse o quanto antes o dreno do seu aparelho, pois aquilo estava interferindo na minha qualidade de vida.
Hoje, mais amadurecida, não tomaria uma atitude dessas. O melhor posicionamento num exemplo assim, seria ir eu mesma e bater na porta dela, com toda educação e alertá-la que o aparelho estava apresentando aquele problema, pois, como vim a saber mais tarde, ela não fazia ideia de que aquilo estava acontecendo.
A grande maioria das reclamações que chegam ao síndico poderiam ser resolvidas de forma mais amigável entre os próprios condôminos, se todos carregassem consigo a bandeira do respeito e do diálogo.
Por vezes temos que tolerar um som mais alto, afinal é aniversário do vizinho. Outra vez é ele quem vai ter que suportar as conversas e risadas até altas horas, pois minha família que não via há tempos veio me visitar. Pode ser que sejamos todos acordados eventualmente pelo bebê do apartamento ao lado, pois ele estará doente.
Não podemos sonhar com um mundo melhor se tornamos nosso condomínio um lugar hostil. Não podemos exigir de um presidente ou do síndico, que resolva nossos problemas se não estamos dispostos a tomar as rédeas do nosso comportamento e fazer aquilo que nos cabe.
Quanto mais regras, normas e exigências há num condomínio, mais complicado ele é. O tamanho de um Regimento Interno demonstra a vulnerabilidade da convivência daquele lugar. É certo que as normas servem para regular a convivência e moldar os costumes, mas a finalidade é sempre a boa convivência, a ordem e a harmonia. Então se cada um trouxer dentro de si a clareza e afinidade com esse objetivo, o Regimento vai ficar empoeirado na estante, e ainda assim, todos estarão satisfeitos com essa pequena sociedade.
Você síndico está lendo isso e pode ser que esteja concordando, e pode ser também que esteja pensando que a realidade não é bem essa. Você é o guerreiro que enfrenta no dia a dia o mau humor, as queixas sem fim, as picuinhas dos condôminos e pode estar se perguntando como amenizar tudo isso.
O ponto principal em qualquer sociedade é a cultura intrínseca, que se reflete nas atitudes das pessoas. Bem, a cultura não se muda no virar de uma chave. É um processo longo e demorado, mas que alguém precisa desencadear. O síndico precisa se despir do papel de resolver todas as coisas.
Que tal devolver a questão para quem está lhe trazendo uma queixa de algum outro morador? Experimente perguntar para o reclamante se ele já tentou resolver a questão diretamente com o reclamado. Diga que entende sua posição e o leve a pensar sobre entender também o outro lado. Faça com que ele reflita, que se coloque no lugar do outro. Um posicionamento assim pode não surtir efeito imediatamente, mas com certeza estará plantando uma sementinha que tem tudo pra brotar e conduzir seu condomínio num lugar com menos queixas e mais atitude.
Martinha Silva é graduada em Administração, especialista em Gestão de Pessoas, gestora condominial em Itajaí e escritora.