Juiz determinou que construtora prove que construções são legais

Os problemas apontados pelo MPE-MS (Ministério Público Estadual) em relação a construção de cinco condomínios da construtora MRV Engenharia, e que motivaram, ação civil pública, impactam diariamente a rotina de quem vive há décadas na região do Pioneiros, em Campo Grande.

A própria ação que fez com que o juiz David de Oliveira Gomes Filho determinasse que a construtora apresente documentação em relação às construções é resultado de reclamação dos moradores, que procuraram o MP há cinco anos, na época em que os prédios eram construídos.

Hoje, com três dos cinco prédios já ocupados por grande parte dos 9,7 mil moradores esperados pela construtora, quem é morador antigo do bairro conta que a realidade é bem diferente de alguns anos atrás.

Vera Lucia Rosa, de 66 anos, vive há 30 na Rua Lago Eriê, na Vila Adelina. Vizinha dos condomínios, ela relata que vários problemas são enfrentados por quem vive nas redondezas dos prédios.

O lixo descartado pelos que vivem no prédio, por exemplo, fazem com que moscas, ratos e baratas invadam a residência da aposentada.

Além disso, o aumento de fluxo de carros e a violência na região assustam a família. “Meu marido não deixa mais o carro na rua como fazia antigamente. Pessoas usam drogas do lado da minha casa”, conta.

Outro impacto lembrado pela idosa é um dos questionamentos do Ministério Público. Segundo ela, desde que os imóveis foram inaugurados, conseguir atendimento na UBSF Pioneira (Unidade Básica de Saúde da Família) se tornou tarefa complicada.

“Sempre está lotado, aumentou muito o número de pessoas”, disse.

Outro que também reclama da falta de estrutura do bairro para receber os milhares de moradores é o funcionário público Luiz Mario de Almeida Ribeiro, de 57 anos. Ele conta que além das estruturas públicas, comércio também é um problema na região.

Luiz vive há 26 anos no bairro e também testemunhou a construção dos prédios, que gerou até confecção de abaixo-assinados dos vizinhos por problemas com as equipes que trabalham na obra.

Processo
O principal problema apontado pelo MP em denúncia à Justiça estaria relacionado com o EIV (Estudo de Impacto de Vizinhança), que conforme a promotora não levou em conta vários critérios exigidos pela legislação ambiental.

Após análise do documento apresentado pela construtora à prefeitura, na época em que solicitava autorização para construção, antes de 2011, a promotora concluiu que o estudo apresenta “graves falhas de planejamento que redundarão em perda da qualidade de vida e bem estar dos cidadãos moradores do Bairro Pioneiros”.

Outra falha apontada pela promotora tem relação com o aumento dos moradores na região, cerca de 9,7 mil habitantes novos. Antes da construção dos edifícios, o bairro possuía 14,2 mil moradores.

“Ou seja, a população do bairro praticamente vai dobrar e os equipamentos existentes continuarão os mesmos”, diz a promotora.

Itens como drenagem de águas pluviais, abastecimento de energia elétrica, existência de unidades de saúde no entorno, impactos no trânsito da região, patrimônio natural não foram contemplados pelo estudo ou foram falhos, de acordo com a denúncia do MPE.

A promotora ressalta, ainda, que as autorizações para construção foram emitidas sem o parecer técnico do CDU (Comissão de Diretrizes Urbanísticas).

A construção de uma fábrica de trilhos e lajes e outra de blocos estruturais no canteiro de obras dos condomínios também é considerada irregular pelo MP.

Na ação civil pública, o MPE pede que a construtora MRV apresente documentação detalhada em relação aos prédios e prove que tudo está dentro da legalidade.

O mesmo pedido foi endereçado à prefeitura de Campo Grande. Outros pedidos como declarar nulas as licenças obtidas para construção dos prédios e formulação de um novo estudo de impactos de vizinhanças também foram solicitados pela promotora.

Em decisão publicada nesta quinta-feira (9), o juiz David de Oliveira Gomes Filho, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, aceitou o pedido em caráter liminar do MP para que a MRV apresente toda documentação.

Outro lado
Em contestação apresentada pela defesa da construtora há duas semanas, a MRV pediu que a denúncia fosse extinta e considerada improcedente pelo judiciário. Pedido negado pelo magistrado na decisão de ontem.

Segundo advogados da empresa, a denúncia do MP não apresentou motivos claros e precisos que dessem subsídios para o pedido de cancelamento das autorizações de construção entre outras coisas.

Outro ponto apresentado pela defesa é em relação a uma das leis ambientais citadas pelo MP, de 2011, que seria anterior à data de apresentação da documentação por parte da construtora à prefeitura.

“Ora, no campo ambiental urbanístico, sabidamente, a norma vigente à época dos fatos, e não a contemporânea ao julgamento da causa, há de incidir para a definição de regularidade a ser observada, sob pena de evidente afronta ao ato jurídico perfeito”, disse a defesa.